Valmir Leôncio da Silva
Matéria publicada no jornal o Estado de São Paulo, desta sexta-feira, 25/01/2019 (Aniversário de São Paulo), afirma que os Tribunais de Contas negociam o fim da “maquiagem” nos dados dos Estados.
Segundo a reportagem após serem avaliadas as contas de Estados que agora decretam calamidade financeira, os tribunais iniciaram uma negociação para tentar desfazer as maquiagens (g.n), que retardam o real diagnóstico da situação fiscal dos governos regionais. A ideia seria unificar os entendimentos sobre a LRF, já que alguns estados flexibilizaram esses limites e assim permitiram a contratação de empresas e aumentos salariais que colocaram as contas destes Estados à beira de um colapso.
É bom lembrar que a LC 101/00 - LRF (Lei de responsabilidade Fiscal),foi editada em 04/05/2000, um momento em que se estava estabelecido o “caos” nas contas públicas, os Estados e Municípios em sua maioria estavam com altos déficits (valores em caixa menor que os valores a pagar), o que dificultava aos administradores uma boa gestão dos recursos públicos, pois esses déficits vinham se acumulando de longa data.
Um verdadeiro manual de conduta para o administrador público a LRF em seu art. 1º estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, onde se pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites, ou seja da para perceber o verdadeiro espirito da lei, onde ela preza por um bom planejamento é uma boa execução orçamentária.
Aqui em São Paulo, por exemplo, o déficit financeiro era muito alto, pois o valor a pagar era muito maior que os recursos arrecadados, outro ponto era a questão da realização das despesas que muitas vezes eram feitas sem a devida contrapartida de recursos. Por outro lado o município de São Paulo não tinha problemas com gasto com pessoal, pois estava dentro dos limites estabelecidos por outras legislações vigentes a época.
Logo que entrou em vigor a Lei de Responsabilidade Fiscal causou grande alvoroço em todo âmbito público, pois logo em seguida foi aprovada a lei de crimes fiscais, Lei nº 10.028 de 19/10/2000, que criou os crimes contra as finanças públicas, arts. 359-A ao 359-H, que entre outras penalidades prevê pena de detenção e de reclusão aos administradores públicos que gastarem além de suas receitas realizadas.
Uma matéria publicada no jornal o Estado de São Paulo, de 10/01/2003, dizia que “O Tribunal de Contas do estado (TCE) reprovou as contas de 394 prefeituras paulistas por violação à Lei de responsabilidade Fiscal, no período entre janeiro e dezembro de 2002. Um total de 141 municípios recebeu parecer desfavorável dos Conselheiros das duas câmaras do TCE por emissão de restos a pagar – realização de despesas sem suficiência de caixa no exercício em que a dívida foi assumida. Cinco prefeituras excederam gastos com pessoal, estourando o percentual legal (60% da receita corrente líquida). Cinco apresentaram déficit orçamentário. Outras 122 não cumpriram a aplicação mínima no ensino, correspondente a 25% da receita de impostos.
(...)
O TCE decidiu entregar ao Ministério Público os casos dos municípios com contas rejeitadas. Os mais graves são os relativos a restos a pagar, expediente que compromete o exercício seguinte da administração e incha o endividamento. A Justiça já abriu nove ações contra administradores por violação fiscal. As ações foram abertas com base na Lei de Improbidade. ”
Esse pequeno exemplo serve para mostrar o poder que tem a lei de Responsabilidade fiscal se for bem utilizada e não ser utilizada como instrumento de manobra politica.
Não adianta termos diversas legislações e ao mesmo tempo vários pontos de vista sobre essas mesmas legislações, e preciso no mínimo convergirmos para um mesmo entendimento para que não haja privilégios para nenhum ente público e também para que os Tribunais de Contas, por meio de seus agentes, possam fiscalizar o que acontece na administração pública, com conceitos que sabidamente serão aceitos pelos Tribunais de Contas.
Dessa forma entendo muito importante a reunião que acontecerá nos dias 6 e 7 de fevereiro, entre a Secretaria do Tesouro Nacional e 21 dos 33 Tribunais de Contas, inclusive o TCMSP, objetivando a harmonização dos procedimentos de fiscalização e os critérios de Contabilidade dos Estados e Municípios, tema aliás, que discuto desde 2008, ano em que começamos a convergência da nossa contabilidade pública às normas internacionais editadas pelo IFAC-International Federation of Accountants ao padrão internacional, emitido pelo International Public Sector Accounting Standards Board (Ipsasb), que deverão ser publicadas, gradualmente, até 2021.
Essa convergência, bem como as demais ações de aprimoramento na área contábil e de fiscalização proporcionarão maior transparência às contas públicas garantindo melhorias no desempenho da administração pública, efetividade do controle social, e o equilíbrio das contas públicas.
Valmir Leôncio da Silva é Auditor do TCMSP – Tribunal de Contas do Município de São Paulo, Conselheiro do CRCSP e Membro da Academia Paulista de Contabilidade. E autor do livro A Nova Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2014 e coator do Livro Lei de Responsabilidade Fiscal para os municípios – uma abordagem prática. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2007.