Assessoria de Comunicação, 14/11/2023
Na manhã da segunda-feira, 13 de novembro, o Programa Encontros Plurais, da Escola Superior de Gestão e Contas Públicas (EGC) do Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCMSP) recebeu o historiador Ramatis Jacino, docente do Bacharelado em Ciências Econômicas do Programa de Pós-graduação em Economia Política Mundial e membro do Núcleo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros da Universidade Federal do ABC. Mestre e doutor pela Universidade de São Paulo (USP), Ramatis tem pós-doutorado pela Universidade de Coimbra e é autor do livro "Desigualdade Racial no Brasil: Causas e Consequências". Na entrevista, o historiador fez algumas reflexões em alusão ao mês da Consciência Negra e tratou, sobretudo, da violência institucional e sistêmica contra a população preta, pobre e periférica. Aproveitou também para reforçar a proposta feita por ele e pela ex-ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, de se criar um Pacto Nacional em Defesa da Juventude Preta, Pobre e Periférica.
A apresentadora do programa, a jornalista Angélica Fernandes, destacou a importância dessa proposta e de se implementar políticas públicas específicas e ações exclusivas para a população negra, particularmente os jovens, dando também visibilidade para esse segmento da sociedade, que sofre todo tipo de discriminação e violência. “Ela precisa existir em todos os espaços de forma plena”, afirmou.
Ramatis Jacino lembrou a tragédia do racismo e da desigualdade racial no Brasil. ‘É uma desigualdade construída a partir de 350 anos de escravidão, quando a riqueza produzida no Brasil pelos africanos sequestrados em terras roubadas dos indígenas era apropriada pela oligarquia brasileira e pelos colonizadores portugueses”, afirmou, lembrando que essa desigualdade foi materializada principalmente no período de transição do trabalho escravo para o assalariado. “Isso porque os escravizados não se transformaram em trabalhadores assalariados e pudessem a partir daí ter ascensão social e se integrarem à sociedade.” E nesse quadro de exclusão, Ramatis destacou que um dos grupos sociais mais vulnerabilizados é o da juventude preta, pobre e periférica, que tem sido massacrada pelo poder do Estado. “Por meio da violência policial sistemática e o índice de encarceramento dessa juventude e na maneira precoce como a sociedade os empurra para o mercado de trabalho”, afirmou.
É nesse bojo que surge a proposta do Pacto, para preservar esses jovens. “Não apenas por uma questão humanitária, mas também por uma lógica econômica, que é a ótica valorizada numa sociedade capitalista”, justificou Ramatis, uma vez que essa população está em pleno vigor laboral. “Queremos envolver as três esferas de governo, os poderes da República e a sociedade civil como um todo neste pacto em defesa dessa juventude, à semelhança do que ocorreu no início dos anos 1990 com a campanha de combate à fome, idealizada pelo sociólogo Betinho”, propôs Ramatis, afirmando que essa iniciativa também vai ao encontro da proposta de reconstrução nacional e de pacificação do país, depois de um período de desmonte das políticas públicas e difusão de discursos de ódio. “E essa transformação passa pela Educação. É fundamental que criemos mecanismos, até mesmo com bolsas de estudo, para manter esses jovens na escola, sobretudo no Ensino Médio, evitando sua inserção precoce no mercado de trabalho”, enfatizou.
Ao prestigiar o programa, o conselheiro supervisor da EGC, João Antonio da Silva Filho, lembrou a trajetória de vida de Ramatis e sua luta contra a desigualdade e o racismo estrutural no país. “Em relação à proposta do Pacto, é preciso que os governos a elegem como prioritária, porque o dinheiro é sempre curto, mas, mesmo com dinheiro insuficiente, se houver vontade política dos agentes políticos maior será a efetividade da política pública. E esse pacto vai em direção de pensarmos uma sociedade que supere o individualismo competitivo e coloque o ser humano no centro das preocupações, numa perspectiva de estimular a solidariedade social”, destacou o conselheiro João Antonio.
Dividindo o papel de entrevistadora com a apresentadora do Encontro Plurais, Suelem Benício Lima, assessora da EGC, questionou Ramatis Jacino sobre o desafio de se criar o Pacto nos moldes propostos numa perspectiva federativa, pois envolve um diálogo entre União, Estados e Munícipios. “Tivemos uma experiência do Programa Juventude Viva, que era concebido pelo Governo Federal, numa perspectiva indutora, que tinha como foco os principais territórios de violência em relação à população jovem, preta e periférica, e houve pouca adesão política dos gestores de fazer um programa com esse foco de pessoas beneficiadas”, questionou.
Para Ramatis, seria necessário que o Governo Federal desenvolvesse um programa injetando recursos consideráveis que seria a contrapartida para a adesão a esse pacto em favor da juventude preta, pobre e periférica. “É difícil, mas temos experiência recente de movimentos políticos que atingiram um nível de concordância entre atores de diferentes posições, mas que se reuniram em benefício de um bem comum”, argumentou o historiador, se não por questões humanitárias até mesmo porque a morte e o encarceramento em massa desses jovens representam um enorme prejuízo para o Brasil. “O custo para manter uma criança e um adolescente na escola é em torno de 480 reais. Para manter um jovem encarcerado, muitas vezes por conta de delitos de baixo potencial ofensivo, é de 1.800 reais”, exemplificou.
Ao final, a palavra foi aberta ao público, formado em sua maioria por alunos do Programa Jovem Monitor Cultural, que, numa parceria entre a Secretaria Municipal de Cultura e a EGC, busca qualificar jovens para trabalhar em equipamentos culturais da cidade de São Paulo.
Assista à íntegra dos Encontros Plurais:
Historiador Ramatis Jacino
Conselheiro supervisor da EGC, João Antonio da Silva Filho
Apresentadora do programa, a jornalista Angélica Fernandes
Suelem Benício Lima, assessora da EGC
Da esquerda para direita: Ricardo Panato, direitor-presidente da EGC; Angélica Fernandes,
jornalista e apresentadora do programa; Ramatis Jacino, historiador;
Suelem Benício Lima, assessora da EGC e Marcos Barreto, chefe de gabinete da EGC