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Eliana Verdade

A área da Saúde tem adotado amplamente no país o modelo de governança pautado em parcerias firmadas entre o Poder Público e Organizações do Terceiro Setor. A casuística acumula lastro desde 1998 e se estende por vários estados e municípios, tendo configurações bastante distintas e peculiares à cultura e conjuntura loco regional

Em tese, este modelo de governança encontra sustentação na retro alimentação do processo, cuja expressão simplificada pode ser expressa na ilustração que segue.

As parcerias, em grande parte, têm sido formalizadas no instrumento jurídico intitulado Contrato de Gestão. Há, contudo que se ressaltar que a adoção pelo modelo Contrato de Gestão, Convênio, Termo de Parceria ou outro, tem impacto apenas no âmbito jurídico; as demandas e providências afetas à gestão não são, em princípio, suscetíveis ao tipo de instrumento jurídico escolhido.

Esclarecido este entendimento, a proposta deste artigo é tecer reflexões acerca do perfil do conteúdo consignado na peça jurídica, o que, por analogia está intitulado como “personalidade”. Assim, a fim de garantir certa similitude, segue uma definição simples e, a partir dela, abordamos algumas características como se fossem componentes de personalidade do Contrato/Convênio/Termo de Parceria.

Personalidade é um termo abstrato utilizado para descrever e dar uma explicação teórica do conjunto de peculiaridades de um indivíduo que o caracterizam e diferenciam dos outros.  Conjunto de características marcantes de uma pessoa. http://significados.com.br/personalidade

Partindo da premissa de que o Contrato de Gestão/Convênio/Termo de Parceria, ou seja, a peça jurídica eleita, é a principal estratégia a ser considerada nas parcerias firmadas entre o poder público e organizações do Terceiro Setor é factível antever que suas características são determinantes nos resultados alcançados.

Um caráter inicial a ser considerado é sua continência para conciliar harmoniosamente tanto o foco jurídico quanto na gestão. Esta continência, se albergada em condições equânimes, viabiliza lastro para garantir a consecução não apenas do cumprimento das disposições contratuais como também para municiar as eventuais alterações decorrentes das avaliações de resultado e necessidades da população usuária dos serviços de saúde. Quando se enaltece a natureza equânime, isto se reporta à preocupação em garantir condições saudáveis, evitando que, ou o arcabouço no jurídico asfixie a aplicabilidade das disposições plausíveis nas avaliações de desempenho ou, que se esmoreça com o correto e pontual cumprimento aos ditames processuais. Ou seja, dado que a proposta deste artigo está em refletir sobre a “personalidade” da peça jurídica que formaliza a parceria, convém destacar que o cuidado com a conciliação entre os dois focos apontados não incorra na perspectiva patológica de “bipolaridade”.

Um pressuposto adotado em larga escala e com casuística exitosa é o de alocar no corpo do Contrato/Convênio/Termo de Parceria as disposições mais perenes, quais sejam: identificação das partes envolvidas, o objeto, regulamentações oficiais referentes ao SUS, orçamentação inerente, obrigações do contratante e do contratado, penalidades, dentre outras. O contingente de acordo afeto ao sistema de pagamentos, ao conjunto de metas assistenciais por linha de serviço e ao universo de metas qualitativas válidas – isto compreendido no período de um ano – integra anexos específicos. Esta distribuição lógica se baseia em concentrar no corpo do instrumento formal o manancial mais atrelado à sua vigência total – 60 meses e, dispor em anexos o volume de informes cuja configuração, em princípio, não se sustente no período integral abrangido.

Em tese, as avaliações formais de execução das disposições consignadas no instrumento jurídico tem sua periodicidade aposta expressamente. Assim, os períodos de “cortes” de avaliação que demandam repactuações a serem consignadas em Termos Aditivos, pelo cunho didático, ficam mais assertivas reportando-se ao aposto nos Anexos.

Pela própria natureza das parcerias firmadas entre o poder público e organizações do Terceiro Setor, é almejado que o contratante/convenente (ente público) exerça seu papel de “comprador” com inteligência, exigência e no tempo correto. Ilustrando a afirmação, podemos considerar que, se num dado momento a rede de saúde encontra demanda reprimida de x exames de endoscopias digestivas – é devido que nos instrumentos jurídicos de parceria firmados com unidades aptas a oferecer o serviço conste o volume de metas quantitativas deste exame a serem realizadas. Solucionada a demanda reprimida, as projeções estatísticas sanitárias devem estimar lide quantitativa situada em patamares inferiores aos do período anterior. Isto reconhecido, a nova pactuação de metas deve ser oficialmente admitida, o que se dá mediante formalização em Termo Aditivo. Ou seja, os Termos Aditivos, podem de certa forma, evidenciar atuação efetiva das equipes técnicas responsáveis pelo monitoramento, controle e avaliação do desempenho dos mesmos. Inadvertidamente ocorrem interpretações impróprias: entende-se o uso de Termos Aditivos como falha de planejamento, o que na verdade pode significar o exercício pontual e assíduo do Planejamento da Saúde.

Outra condição saudável refere-se à adoção de minuta padrão do Contrato de Gestão/Convênio/Termo de Parceria. Em se reconhecendo que a estrutura da peça jurídica é validada pelas instâncias de fiscalização, em caso de novas parcerias a serem assinadas, cabe às instâncias técnicas da Saúde providenciar a alocação dos resultados de seus estudos especializados na modelagem estabelecida. Esta convenção traz intrínseca notória condição de abreviar retrabalho e ainda, evitar atrofias no arcabouço da gestão e procedimentos invasivos do foco jurídico. Neste sentido, permitimo-nos mais uma ilustração.

Em determinada unidade da federação adotou-se como Indicador expresso em Contrato de Gestão “Taxa de ocupação superior a 85%”, sendo que esta medição consta firmada no Anexo de Sistema de Pagamentos para significar 30% sobre o orçamento vinculado à linha de Internação.

Sob a óptica da gestão, a apuração deste Indicador deve ser minimamente contraposta aos Indicadores de Permanência Média e às análises de perfil epidemiológico delineadas no período de referência. Isoladamente, não é possível aquilatar se os diagnósticos identificados pela equipe técnica responsável pelo monitoramento condizem com a Permanência Média desejada. Pode-se atingir 85% de taxa de ocupação sem, contudo estabelecer-se o Giro de Leito desejado; ou seja, a taxa de ocupação não garante que se alcance a otimização dos leitos pelo maior número de pacientes possível. Isto pode induzir à dilatação do tempo de internação por patologias mais simples.

Ou seja, este tipo de análise repousa na expertise dos técnicos da área sanitária.

Os indicadores apostos, originariamente integram, dentre muitos outros, o escopo de acompanhamento da gestão, não se constituindo em metas propriamente ditas e sim, como Indicadores.

A inclusão de indicadores no instrumento jurídico de parceria com o propósito de que os mesmos sejam balizadores de penalizações financeiras apenas pela óptica jurídica pode debilitar a efetiva avaliação de desempenho da gestão em saúde; quando o desejável no modelo de governança OSS é de que os focos no jurídico e na gestão sejam complementares, qual seja, os fundamentos especializados em gestão de saúde sejam reconhecidos e os ditames do arcabouço protocolar sejam respeitados.

Neste caso particular há que se ressaltar há redundância, pois todos os cálculos previamente efetuados para definição das metas quantitativas foram baseados em fórmulas lastreadas na literatura da área, a qual define como parâmetro 85% de taxa de ocupação.

Retornando ao propósito de refletir sobre a “personalidade” do instrumento jurídico de parceria, pode-se inferir que inserções conforme a apresentada na ilustração acima, impactam fortemente na performance do desempenho das equipes técnicas da saúde. O detalhamento excessivo - que incorpora até a redundância - inibe as possibilidades de análises técnicas que municiem a operação de deliberações de cunho sanitário e consome os recursos humanos disponíveis na elaboração de registros burocráticos.

Outra qualidade oportuna a ser preservada na personalidade do Contrato/Convênio/Termo de Parceria é a periodicidade dos tempos de “corte” para as avaliações formais. Obviamente o monitoramento precisa ser pontual e assíduo, entretanto as tendências e os impactos de ocorrências aleatórias, só expressam consistência quando apurados sob a óptica de meses consecutivos (trimestral, quadrimestral, semestral). Se no formal de parceria se define a apuração mensal (o que tem que acontecer – conste ou não expresso na peça jurídica) os técnicos da saúde responsáveis pelo monitoramento da gestão são, novamente muito absorvidos na elaboração de registros burocráticos e menos se faz no âmbito de monitoramento da área sanitária.

Retomando a definição expressa no início do artigo onde se entende por “Personalidade o conjunto de características que determinam padrões de conduta...”, há que se concluir que se o Contrato/Convênio/Termo de Parceria é a peça estratégica fundamental nas relações de parceria na área da saúde, sua “personalidade” é determinante do modus operandi.

SOBRE A AUTORA
Formação acadêmica
Serviço Social, conclusão em 1976.
Administração hospitalar, em 1985. (incompleto)
MBA em Economia e Gestão de Organizações de Saúde, 2002/2003. Monografia “Programa de Comunicação Integrada de Marketing para o modelo Organização Social de Saúde implantado pela Secretaria Estadual de Saúde em São Paulo”.

Experiência Profissional
Professora Escola de Contas – TCM São Paulo (desde julho/15)
Gerente de Custos SPDM (de 2008 a 2015)
Diretora de Departamento de Gestão de Contratos e Convênios - Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo (de 2001 a 2008)
Professora no Curso Superior de Formação Específica em Gestão em Saúde, UNIFESP – Escola Paulista de Medicina (2004 a 2006)
Diretora administrativo financeiro no SECONCI - Serviço Social da Construção Civil do Estado de São Paulo (1981 a 2001)
Consultora por notório saber na Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (2008 a 2010)
Consultora por notório saber, na Secretaria Estadual de Gestão de Recursos Humanos no Estado do Espírito Santo (2010 a 2014).
Palestras em vários estados da federação.

Trabalhos publicados
? Artigo publicado na coletânea “Para entender a saúde no Brasil”, 2007, Editora LCTE – “Implantação do sistema de custos hospitalares em hospitais públicos administrados por OSS”
? Artigo publicado na Revista de Administração em Saúde, volume 12 nº 46 janeiro-março, 2010 – “Contratualização na Saúde: proposta de um Contrato Único para os programas no Estado de Minas Gerais”.
? Artigo publicado na Revista de Administração Hospitalar e Inovação em Saúde, nº 4 janeiro-junho, 2010 – Faculdade de Ciências Econômicas – Face UFMG e Associação de Hospitais de Minas Gerais - AHMG “Sistema de Custos implantado em hospitais públicos administrados por Organizações Sociais de Saúde – OSS, no estado de São Paulo”.
? Artigo publicado no Resumo dos Trabalhos do 34º Encontro da ANPAD – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração, 34º EnANPAD 2010 “O Processo de Contratualização da SES/MG: a Proposta de um Contrato Único no Âmbito dos Programas Estaduais”.

Referência bibliográfica
Christianne Stroppa, especialista em Direito Administrativo, colaboradora do TCM SP. 2016, entrevista da autora.
João Silvestre dos Santos, especialista em Auditoria Contábil na área da Saúde, colaborador do TCM SP. 2016, entrevista da autora.
https://wikipedia.org/wiki/Personalidade


Comentários

0 # Melina Silva Pecora 01-03-2016 15:16
Artigo muito bem escrito, que coloca pontos importantes. O que considero de maior destaque e importância são as minutas padrões para este tipo de contratos que devem ser seguidas, a fim de que facilite o controle destes contratos.
0 # Escola de Contas 04-03-2016 17:22
Boa tarde, Melina.

Agradecemos o contato. Acompanhe nossos textos no link http://www.escoladecontas.tcm.sp.gov.br/opiniao.

Atenciosamente

Escola de Contas

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